É certo que muitas coisas más são pelos maus praticadas contra a vontade de Deus. Mas tão grande é a Sua sabedoria e tamanha é a Sua virtude que tudo, mesmo o que parece contrário à Sua vontade, tende para os fins e resultados que Ele antecipadamente viu como bons e justos. Por isso, quando se diz que Deus muda de vontade, que, por exemplo, fica irado contra aqueles para quem era brando, - não foi Ele mas foram os homens que mudaram e de certo modo o acham mudado nas mudanças que experimentam: tal qual como o Sol muda para os olhos enfermos - de suave torna-se de certa maneira áspero, de deleitosos torna-se molesto, embora ele próprio continue a ser o mesmo que era. Também se chama de Deus a vontade que Ele suscita nos corações dos que obedecem aos seus mandamentos e da qual diz o Apóstolo:
É Deus que opera em nós o próprio querer (Deus enim est, qui operatur in nobis et velle - Filipenses 2:13);
como se chama de Deus não só a justiça pela qual Ele próprio é justo, mas também a que Ele faz no homem que por Ele é justificado. Da mesma forma se chama de Deus a lei que é antes dos homens mas que por Ele foi dada; pois eram realmente homens aqueles a quem Jesus dizia:
Está escrito na vossa lei (In lege vestra scriptum est -João 8:17),
embora noutra passagem leiamos:
A lei do seu Deus está no seu coração (Lex Dei ejus in corde ejus -Salmo 37:31).
Conforme esta vontade que Deus produz nos homens, diz-se que Ele quer o que Ele próprio não quer, mas faz com que os seus isso queiram, como se diz que Ele conheceu o que Ele fez que fosse conhecido por aqueles que isso ignoravam. Pois, nem quando o Apóstolo diz:
Mas conhecendo agora a Deus, ou melhor, conhecidos de Deus (Nunc autem cognoscentes Deum, immo cogniti a Deo -Gálatas 4:9),
é lícito que acreditemos que Deus conheceu então os que conhecia antes da criação do mundo; mas diz-se que conheceu então o que fez com que então fosse conhecido. Destas formas de expressão recordo-me que já se tratou nos livros anteriores. É, pois, conforme essa vontade (pela qual, como dizemos, Deus quer o que faz querer ao outros, pelos quais são ignoradas as coisas futuras) que Ele quer muitas coisas mas não é Ele que as faz.
Com efeito, os seus santos, com uma vontade santa por Ele inspirada, querem que se façam muitas coisas que não chegam a ser feitas; como rogam piedosa e santamente por alguns, mas Ele não faz o que lhe pedem, sendo Ele quem, pelo Seu Espírito, causa neles essa vontade de orar. Por isso, quando os santos querem e rogam, em conformidade com Deus, que cada um seja salvo, podemos dizer, segundo esse tipo de expressões: Deus quer mas não faz; dizemos então que Ele quer no sentido de que Ele faz com que os outros queiram. Mas, conforme essa vontade, que é sua e eterna como a sua presciência, claro está que tudo o que quis no Céu e na Terra, tanto passado e presente como futuro, fê-lo já. Mas antes que chegue o tempo em que se cumprirá como Ele quis o que antes de todos os tempos Ele previu e determinou, nós dizemos: Acontecerá quando Deus quiser; mas se ignoramos dum acontecimento, não só o momento (tempus) em que virá a acontecer, mas também se chegará a acontecer, então dizemos: Acontecerá se Deus quiser: não porque Deus venha a ter então uma vontade nova que antes não tinha, mas porque só então acontecerá aquilo que desde toda a eternidade está preparado na sua vontade imutável.
É Deus que opera em nós o próprio querer (Deus enim est, qui operatur in nobis et velle - Filipenses 2:13);
como se chama de Deus não só a justiça pela qual Ele próprio é justo, mas também a que Ele faz no homem que por Ele é justificado. Da mesma forma se chama de Deus a lei que é antes dos homens mas que por Ele foi dada; pois eram realmente homens aqueles a quem Jesus dizia:
Está escrito na vossa lei (In lege vestra scriptum est -João 8:17),
embora noutra passagem leiamos:
A lei do seu Deus está no seu coração (Lex Dei ejus in corde ejus -Salmo 37:31).
Conforme esta vontade que Deus produz nos homens, diz-se que Ele quer o que Ele próprio não quer, mas faz com que os seus isso queiram, como se diz que Ele conheceu o que Ele fez que fosse conhecido por aqueles que isso ignoravam. Pois, nem quando o Apóstolo diz:
Mas conhecendo agora a Deus, ou melhor, conhecidos de Deus (Nunc autem cognoscentes Deum, immo cogniti a Deo -Gálatas 4:9),
é lícito que acreditemos que Deus conheceu então os que conhecia antes da criação do mundo; mas diz-se que conheceu então o que fez com que então fosse conhecido. Destas formas de expressão recordo-me que já se tratou nos livros anteriores. É, pois, conforme essa vontade (pela qual, como dizemos, Deus quer o que faz querer ao outros, pelos quais são ignoradas as coisas futuras) que Ele quer muitas coisas mas não é Ele que as faz.
Com efeito, os seus santos, com uma vontade santa por Ele inspirada, querem que se façam muitas coisas que não chegam a ser feitas; como rogam piedosa e santamente por alguns, mas Ele não faz o que lhe pedem, sendo Ele quem, pelo Seu Espírito, causa neles essa vontade de orar. Por isso, quando os santos querem e rogam, em conformidade com Deus, que cada um seja salvo, podemos dizer, segundo esse tipo de expressões: Deus quer mas não faz; dizemos então que Ele quer no sentido de que Ele faz com que os outros queiram. Mas, conforme essa vontade, que é sua e eterna como a sua presciência, claro está que tudo o que quis no Céu e na Terra, tanto passado e presente como futuro, fê-lo já. Mas antes que chegue o tempo em que se cumprirá como Ele quis o que antes de todos os tempos Ele previu e determinou, nós dizemos: Acontecerá quando Deus quiser; mas se ignoramos dum acontecimento, não só o momento (tempus) em que virá a acontecer, mas também se chegará a acontecer, então dizemos: Acontecerá se Deus quiser: não porque Deus venha a ter então uma vontade nova que antes não tinha, mas porque só então acontecerá aquilo que desde toda a eternidade está preparado na sua vontade imutável.
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